Eram não sei que horas do principio de uma noite passada quando recomeçaram a furar. A rocha atravessada pelas poderosas e impiedosas ferramentas metálicas chega à superficie, transportada pela lama injectada no furo, já cansada e transformada numa soma milimétrica do todo que foi outrora. A profundidade, a cerca de 1300 metros, coincide com a zona decretada como produtiva em hidrocarbonetos e, como tal, é também produtiva em grandes expectativas. Por isso, há conveniência em conduzir uma operacão de furação um pouco diferente, com recuperacão de amostra directamente do fundo do furo: o coring. Isto implica basicamente o posicionamento de um grande tubo de aluminio (ou PVC) no interior de uma outra tubagem de liga metálica, imediatamente comunicante com a ferramenta cortante (o bit). À medida que o bit se desloca em profundidade, os cerca de 18 metros de tubo interior são inundados pela amostra recém cortada, onde esta permanece, inalterada e imóvel, até ser transportada e exposta na superficie. Depois da primeira tentativa fracassada no dia anterior, o segundo coring é bem sucedido e apresenta-se à superficie já pela madrugada adentro. Obtém-se a totalidade de recuperação de amostra (os tais 18m) e o odor oleoso não engana; a rocha, mortalmente trespassada, ainda sangra um pouco de petróleo pela extremidade do tubo. Os primeiros raios de sol chegam finalmente e a rocha, qual esponja embebida em óleo, torna-se ainda mais pesada de brilho, quase de metal precioso. E a luz nos olhos das pessoas também é diferente. Por isso, baixo os olhos em pesar e contemplação.
[Embora já tenha assistido a esta operação no passado, ocorrem-me sempre nestes momentos algumas interrogações retóricas acerca do como este fluido sujo e gorduroso possa ser a vitalidade da civilização e se encontrar logo aqui, debaixo deste triste e solitário deserto, quase esquecido. Vivemos com esta energia fóssil numa simbiose na qual somos nós os parasitas e, no entanto, é amplamente sabido que na natureza, poucos são os parasitas que sobrevivem à morte do hospedeiro. As consequências do anunciado esgotamento desta energia já se estão a sentir mas continua a ser preferido o debate de ideias à implementação de acções. Ocorre-me também que o senhor Bush afinal não deve ser assim tão parvo como o pintam, apesar dos muitos comentários sem nexo (e estúpidos vá) que produz. Ao fim ao cabo, anda mais de meio mundo a aumentar a extracção do petróleo, já que o barril nunca foi vendido a tão alto preço, enquanto que os amigos dos USA fazem uns quantos furos que asseguram o seu consumo interno. O resto da sua reserva está por explorar. E o futuro é já amanhã. Talvez ainda seja possivel amplificar a produção das ditas energias alternativas. Ou esperar mais tempo para ver o que realmente acontece. Ou produzir um motor movido a água salgada (...ou a bananas). Ou... sei lá. Mas sei que o petróleo vai acabar um dia e que o relógio não pára.]
Apesar de possuir ideias algo concretas, mas raramente estáticas, acerca do petróleo enquanto alimento de uma civilização dependente e esfomeada por energia, não consigo deixar de me apoderar deste brilho que escorre do calcário no interior do tubo. O brilho forte e o odor inebriante afinal de contas são o poder e o sucesso. Apesar de se ter atingido um pequeno reservatório, olho à minha volta e há um deserto quieto a acordar, que se estende até onde a minha vista alcança, em todas as direcções, e muito mais além. Devo ter sorrido de ironia. O que está debaixo dele é que conta. Tudo o resto não deve interessar para nada. Tudo está bem e até me lembro de uma música do SG, de dias felizes e vou-me embora com um brilhosinho nos olhos. Passa das 9h e a noite foi longa e trabalhosa. Vou dormir. Já devo é de estar cansado.
[Embora já tenha assistido a esta operação no passado, ocorrem-me sempre nestes momentos algumas interrogações retóricas acerca do como este fluido sujo e gorduroso possa ser a vitalidade da civilização e se encontrar logo aqui, debaixo deste triste e solitário deserto, quase esquecido. Vivemos com esta energia fóssil numa simbiose na qual somos nós os parasitas e, no entanto, é amplamente sabido que na natureza, poucos são os parasitas que sobrevivem à morte do hospedeiro. As consequências do anunciado esgotamento desta energia já se estão a sentir mas continua a ser preferido o debate de ideias à implementação de acções. Ocorre-me também que o senhor Bush afinal não deve ser assim tão parvo como o pintam, apesar dos muitos comentários sem nexo (e estúpidos vá) que produz. Ao fim ao cabo, anda mais de meio mundo a aumentar a extracção do petróleo, já que o barril nunca foi vendido a tão alto preço, enquanto que os amigos dos USA fazem uns quantos furos que asseguram o seu consumo interno. O resto da sua reserva está por explorar. E o futuro é já amanhã. Talvez ainda seja possivel amplificar a produção das ditas energias alternativas. Ou esperar mais tempo para ver o que realmente acontece. Ou produzir um motor movido a água salgada (...ou a bananas). Ou... sei lá. Mas sei que o petróleo vai acabar um dia e que o relógio não pára.]
Apesar de possuir ideias algo concretas, mas raramente estáticas, acerca do petróleo enquanto alimento de uma civilização dependente e esfomeada por energia, não consigo deixar de me apoderar deste brilho que escorre do calcário no interior do tubo. O brilho forte e o odor inebriante afinal de contas são o poder e o sucesso. Apesar de se ter atingido um pequeno reservatório, olho à minha volta e há um deserto quieto a acordar, que se estende até onde a minha vista alcança, em todas as direcções, e muito mais além. Devo ter sorrido de ironia. O que está debaixo dele é que conta. Tudo o resto não deve interessar para nada. Tudo está bem e até me lembro de uma música do SG, de dias felizes e vou-me embora com um brilhosinho nos olhos. Passa das 9h e a noite foi longa e trabalhosa. Vou dormir. Já devo é de estar cansado.
O core à superficie, no momento em que foi aberto.
3 comentários:
Rapaz, nem sabia que tinhas continuado a postar! Já não vinha cá há algum tempo e, pelos vistos, postas mais que eu... Ainda bem!
Quanto ao tédio, tens de começar a levar uma garrafa de favaios! Heheheh!
Quando acaba a campanha? Ainda vais pra outro poço?
Hastas Xór Hugo!
Como vês posto onde quer que eu vá. Mas tu também postas como deve ser.
Acabei de chegar a casa, cansado após 3 semanas de trabalho.Não fui para outro poço afinal... Mas trouxe comigo o amigo que andava para lá perdido já há 2 meses! :)
Abraço sôr xkl.
(vê lá se falas do conteúdo, por demais interessante para um geólogo, do que tenho recentemente postado????)
É sempre bom saber mais um pouco..
Enviar um comentário