sábado, 22 de março de 2008

Por aqui, novamente

Subo uma duna e depois outra. Está calor e sinto o suor a percorrer o corpo. Quero alcançar a próxima duna mas encontra-se muito longe e implica atravessar um vale. As distâncias aqui enganam mas na verdade parece-me mesmo muito longe. É melhor ficar por aqui. Não trouxe água e tenho que pensar em voltar. Já são horas. Tiro só mais uma fotografia. E mais outra. Estas visitas ao deserto podiam ser mais interessantes se tivesse um jipe comigo e no entanto isso não substitui o olhar mais atento de quem apenas conduz as pernas. Penso que este deserto ja não me fascina como no inicio. Apesar de vasto e grandioso, continua a parecer-me tão estático como da primeira vez que o vi. É como se cada grão de areia estivesse sempre no mesmo sitio ate alguém o pisar. Contudo, sei que o deserto é das paisagens mais móveis que existem na natureza. O vento transporta a areia grão a grão, construindo e empurrando as altas dunas que aqui existem a uma escala temporal que ao nosso olhar não é significativa. Depois surge a época das tempestades do deserto que apenas em algumas horas podem alterar toda a paisagem. Assim o deserto vive. E vive de longos períodos de calmaria intercalados com eventos de tempestade de curta duração. Tal como as nossas vidas. Talvez por isso eu e o deserto estejamos a voltar as costas um ao outro. Sempre preferi viver a lutar contra as tempestades para melhor saborear o pouco tempo de calmaria. Mas aqui é difícil. Voltar-lhe as costas implica sempre ver a mesma paisagem. Há deserto em todas as direcções. Talvez a vida e a paisagem mudem este ano e aí, poderei apreciar novamente o deserto, talvez de uma outra forma. Sei que não pertenço aqui e que nunca pertenci. Mudar os horizontes também é bom, o como faz parte do caminho.
Esta viagem ao sahara trouxe-me de volta à região de Murzuq para outro poço que está quase terminado. Trabalho à noite sozinho, o que é bastante desagradável pelas razões óbvias. Será assim durante o tempo que aqui permanecer, fazendo uma pausa apenas para a mudanca do rig, que irá viajar uns tantos quilómetros pelo deserto, para a localização do novo poço a furar. Aqui somos como uma comunidade nómada, que se move em função do sustento (neste caso, do petróleo). É sempre interessante e novo assistir a estes eventos que quebram a rotina. Desta vez, está prevista uma mudança de duas semanas, o que para mim significa férias durante esse tempo, com tudo de bom que isso representa, e de mau também... O resultado prático de duas semanas no meio do deserto desocupado será sem duvida o desenvolvimento de altos níveis de apatia e fadiga mental em mim. Acho que trouxe literatura suficiente para me ocupar mas, passar os dias todos a ler não é, em si, uma grande meta. Ou então talvez volte a Tripoli durante esse período, e aí aproveitarei para viajar pela Líbia. De uma forma ou de outra, tentarei manter-me ocupado e dar o máximo de uso ás pernas por essas dunas fora.

Na pequena cidade de Ubari, que não é mais que um oásis aqui perdido no meio da areia. A maior parte das pessoas que aqui vivem são os verdadeiros “donos” do deserto: os Tuaregues. Têm os seus costumes próprios e falam uma lingua diferente da árabe.

É mesmo um oásis.
Muuuuuuu...
No meu jogging matinal o deserto é só meu. Ao fundo avistam-se os maciços rochosos que servem de abrigo à cidade de Ubari.
O rig. O vento. A areia. O nascer do sol.